desj561.jpg

 

Editado por Harlequin Ibérica.

Uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 2003 Laura Wright

© 2019 Harlequin Ibérica, uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.

Longe de casa, n.º 561 - abril 2019

Título original: Sleeping with Beauty

Publicado originalmente por Harlequin Enterprises, Ltd.

 

Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor, incluindo os de reprodução, total ou parcial. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Books S.A.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, carateres, lugares e situações são produto da imaginação do autor ou são utilizados ficticiamente, e qualquer semelhança com pessoas, vivas ou mortas, estabelecimentos de negócios (comerciais), feitos ou situações são pura coincidência.

® Harlequin, Harlequin Desejo e logótipo Harlequin são marcas registadas propriedades de Harlequin Enterprises Limited.

® e ™ são marcas registadas por Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença. As marcas em que aparece ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

Imagem de portada utilizada com a permissão de Harlequin Enterprises Limited. Todos os direitos estão reservados.

 

I.S.B.N.: 978-84-1328-022-6

 

Conversão ebook: MT Color & Diseño, S.L.

Sumário

 

Créditos

Prólogo

Capítulo Um

Capítulo Dois

Capítulo Três

Capítulo Quatro

Capítulo Cinco

Capítulo Seis

Capítulo Sete

Capítulo Oito

Capítulo Nove

Capítulo Dez

Capítulo Onze

Capítulo Doze

Capítulo Treze

Se gostou deste livro…

Prólogo

 

 

 

 

 

 

A princesa Catherine Olivia Ann Thorne estava sentada, direita como uma vela, entre o seu pai e a sua tia Fara. Estavam na mesa presidencial e olhavam para o povo de Llandaron que comia, bebia, dançava e se divertia. Nessa noite, com a única ausência de Alex, o irmão mais velho, celebravam o regresso de Maxim, o irmão mais novo, e da sua esposa Fran, que tinham passado uma longa lua de mel. A família também celebrava a maravilhosa notícia da gravidez de Fran.

Celebravam o amor.

A orquestra de doze músicos tocava canções alegres e o cheiro a cordeiro assado e urze criavam um ambiente de alegria no salão de baile.

Porém, Cathy sentia uma tristeza gelada.

Olhou para o seu irmão e para a sua nova cunhada a dançar muito colados, olhando-se fixamente nos olhos e com sorrisos de intimidade.

Toda a gente podia aperceber-se do muito que se amavam. Cathy não lhes repreendia tanta felicidade. De todo. Adorava o seu irmão e tinha grande consideração por Fran. Só queria sentir um pouco daquela felicidade e daquele amor.

– Catherine, prolongamos por mais um mês a tua viagem pela Europa Oriental.

Cathy sentiu o estômago encolher-se ao ouvir as palavras do seu pai. Tinha voltado da Austrália apenas há três dias e a sua secretária já lhe havia programado uma viagem à Rússia dentro de uma semana.

Agora, além disso, acrescentavam-lhe outro mês.

– Estás pálida, querida Cathy – comentou a sua velha tia Fara com os seus impressionantes olhos violeta transtornados com a preocupação.

O imponente homem de cabelo branco acariciou a mão enluvada da sua filha.

– Passa-se algo contigo?

– Não pai.

A máscara de princesa imperturbável lutava contra a mulher inquieta e arrojada que existia fundo em Cathy.

Algo tinha começado a enfraquecer na sua alma e no seu coração nos últimos meses. A insatisfação aumentava com cada viagem. Naturalmente, gostava muito da sua missão e sobretudo das obras de caridade, mas estava esgotada.

Cathy levantou-se e deixou o guardanapo junto ao prato que não tinha provado.

– Estou muito cansada. Com sua licença, pai, Fara…

Quase nem esperou que eles assentissem com a cabeça.

Saiu da sala com uma elegância natural, resultado da sua educação, atravessou o átrio vazio e subiu as escadas com o vestido cor de alfazema roçando-lhe as pernas trementes.

Precisava de intimidade depois de meses de viagem muito controlados, de protocolo inflexível e de reuniões com a imprensa. O refúgio silencioso, embora temporário, do seu quarto parecia-lhe o paraíso.

No entanto, alguém lhe tapava o caminho para o seu quarto.

– Esse cabelo e esses olhos de ametista…

No corredor havia uma mulher corpulenta, encolhida pela idade, com um vestido longo e recto vermelho e púrpura e uns colares com contas cor de laranja pálido. Cathy não sabia quem era.

– Bem disse à tua mãe que serias muito bonita, rapariga.

Cathy agarrou-se ao corrimão.

– Conheceu a minha mãe?

– Sim. Conhecia a defunta rainha – a mulher sorriu com uma expressão cínica. – Quando tu eras uma semente no ventre da tua mãe, pedi a Sua Alteza Real que me permitisse ler o teu futuro, mas ela rejeitou a minha oferta. Riu-se de mim, isso foi o que ela fez.

O rancor da mulher mostrou-se claramente, embora com um tom apaziguado. Cathy sentiu uma estranha inquietude.

– Quem é você?

A anciã não ligou à pergunta.

– Apesar de tudo, dei o meu presente ao rei e à rainha. Sim, disse-lhes que serias bonita, inteligente e amável. Disse-lhes que serias corajosa e activa – os seus grandes olhos castanhos escureceram. – Disse-lhes que se não se ocupassem muito de ti…

A mulher não terminou a frase e Cathy sentiu como se uma garra lhe agarrasse a espinha dorsal. No entanto, manteve toda a postura de uma princesa e não mostrou o seu temor.

– Penso que deveria acabar a história.

O sorriso pálido da mulher cresceu.

– Disse ao teu pai e à tua mãe que não se ocupassem muito de ti te perderiam.

– Perder-me-iam…?

– Assim é.

Não perdeu um centímetro da sua compostura.

– De que está a falar?

– Estás aí em cima, Cathy?

A pergunta intrometeu-se entre Cathy e a mulher e quebrou o transe que parecia tê-las acorrentadas. Cathy voltou-se com o coração a bater-lhe violentamente e viu Fran, que subia as escadas com o cabelo loiro a cobrir-lhe os ombros.

– Que se passa, Cathy? – os olhos profundos da sua cunhada olhavam-na com preocupação.

– Esta mulher…

Fran esticou o pescoço para olhar por cima da cabeça de Cathy.

– Que mulher?

Cathy ficou gélida, com o pulso loucamente acelerado. Voltou-se lentamente. A mulher tinha desaparecido.

Cathy acabou de subir as escadas sem dizer nada e com Fran colada a si. Cathy não tentou adivinhar onde teria ido aquela mulher nem se a tinha sequer visto. Tentou não pensar em que se calhar tinha enlouquecido.

Entraram no quarto.

– Passa-se algo, Cathy?

Cathy sentou-se na cama com os ombros descaídos. Sim, passava-se algo. Estava completa e absolutamente esgotada. Voltou-se para Fran.

– Sou uma mulher de vinte e cinco anos que raramente esteve sozinha, que raramente conheceu a felicidade e que nunca conheceu o amor. Estou farta de viver a mando de outros – olhou para a sua cunhada. – Sabes o que significa isso, Fran?

Fran pegou-lhe na mão e sentou-se junto a ela.

– Sim. Na verdade sei sim. Eu também nunca vivera de facto até conhecer o teu irmão.

– Porque achas que passaste por isso? Tinhas medo de viver ou…

– Eu acho que tinha medo de acreditar que o amor também existia para mim – Fran sorriu delicadamente, como alguém que tinha descoberto o contrário. – Magoaram-me muito e quis que isso não voltasse a acontecer, mas o teu irmão deu-me uma segunda oportunidade.

Cathy suspirou.

– Gostaria de ter uma primeira oportunidade de viver. Acho que a mereço.

– Claro que sim.

Cathy recordou-se de todos os planos e fantasias que tinha tido durante sete anos. Teria suficiente valor? Estaria tão desesperada para tentar conseguir o que queria?

Talvez a velha quisesse avisá-la de algo e não contar-lhe uma história do passado. Talvez fosse um aviso da sua mãe e da própria Cathy. Talvez quisesse dizer-lhe que se continuasse por aquele caminho de infelicidade, acabaria por perder-se.

Sentiu uma pontada de medo no coração, mas rejeitou-a.

– Agora és minha irmã, Fran. Posso contar contigo?

Fran apertou-lhe a mão.

– Só tens que dizer-me o que queres que faça.

– Ajuda-me a fazer a mala.

Capítulo Um

 

 

 

 

 

 

Os mosquitos picavam-lhe o pescoço, animais que não podia ver faziam uns ruídos que ela não reconhecia e as papas de aveia que tinha comido uma hora antes eram como uma laje de cimento no seu estômago.

No entanto, Cathy nunca tinha sido tão feliz em toda a sua vida.

Três dias antes, tinha levado a cabo o seu plano, traçado durante sete anos, e tinha viajado para os Estados Unidos, com uma mochila às costas, roupa cómoda, passaporte falso, pelo qual tinha pago um preço exorbitante, e a pronúncia norte-americana que tinha aprendido a imitar impecavelmente durante anos de viagens.

Fran tinha cumprido a sua palavra e tinha-a ajudado a fazer a mala e a chegar ao aeroporto. Cathy não lhe disse o seu destino para evitar-lhe a pesada responsabilidade de ter que dizer ao rei para onde tinha fugido a sua filha.

Durante toda a viagem para Nova Iorque, Cathy tinha estado muito preocupada pela relação com o seu pai, mas assim que chegou à Grande Maçã, obrigou-se a esquecer as suas preocupações. Se deixasse de lado a sua angústia em conhecer o paradeiro da sua filha, teria que compreender que naquele estado mental não lhe era muito útil, nem às pessoas que queria que visitasse.

Em Nova Iorque, tomou outro voo para Dallas e daí um segundo voo para Denver. Em Denver tomou um táxi para a agência que organizava passeios e desfrutou da sua liberdade em cada passo que dava.

O seu plano cumprira-se sem contratempos e estava certa de que não a tinham seguido.

Sorriu.

À sua direita, o sol era filtrado pelos fragrantes pinheiros como se quisesse iluminar as pinhas que cobriam o caminho pelo qual avançava. À sua esquerda, umas cascatas de água resplandecente caíam por um desfiladeiro até um rio turbulento. Acima, elevavam-se, majestosamente, as montanhas do Colorado, que eram tão bonitas como lhe tinha contado uma velha amiga da escola.

Era o lugar perfeito para receber uma princesa cansada que fugia.

A empresa de passeios tinha-a deixado ao pé das montanhas de onde saíam e ascendiam diversos caminhos. Seguiu por um caminho com uma mochila cheia de víveres, um bastão, um aerossol de defesa pessoal e um localizador de emergência. Cada noite, seguia o mapa até uma das pequenas cabanas da empresa de passeios. Comeu o que levava na mochila, dormiu sobre um fino e duro colchão de campismo que lhe tinham entregue e não se queixou em nenhum momento.

Gostava daquela liberdade, da aventura e da sobrevivência.

A palavra sobrevivência fez com que parasse bruscamente no meio do caminho estreito. O instinto fez com que inclinasse a cabeça para um lado para escutar.

Tinha ouvido algo.

A três metros abaixo, a água batia contra as rochas. Lá no alto, os pássaros cantavam alegremente nas árvores ondulantes.

Isso já tinha ouvido antes.

Havia algo mais.

Antes que pudesse distinguir o som, todo o pensamento ficou gelado no seu cérebro. Um cavalo e o seu cavaleiro apareceram do bosque espesso. Na sua direcção dirigiam-se um cavalo negro e um homem coberto pelas sombras. O tempo pareceu correr mais devagar, ao ritmo dos cascos do animal.

O coração de Cathy martelava-lhe o peito enquanto tentava pensar algo. Só podia olhar fixamente, imóvel, enquanto o cavalo resfolegava e se aproximava cada vez mais. Em seguida, deu um passo atrás. Queria desviar-se do seu caminho. As pinhas partiam-se sob os seus pés, mas pisou uma pedra que ainda estava molhada pelo orvalho.

Caiu e a mochila rodopiou pelo barranco abaixo. Gritou ao ver as rochas e pensou na predição da mulher.

«Disse-lhes que te perderiam…»

Mas o chão elevou-se para detê-la.

 

 

Uma saraivada de palavrões ecoou nas montanhas. Dan Mason desceu do dócil cavalo e ascendeu até à mulher. Tocou-lhe a mão mas ela não se moveu nem emitiu um som. De onde raio tinha saído? Perguntou-se, olhando em todas as direcções. Aqueles caminhos eram sempre solitários. Especialmente às seis da manhã, quando um homem tentava escapar dos demónios da noite anterior, do mês anterior… dos anos anteriores.

Deu a volta à mulher com toda a delicadeza que consegue um homem acostumado a lidar com delinquentes sem escrúpulos, afastou-lhe as longas madeixas caju e tocou-lhe na base do pescoço. Verificou que o ritmo cardíaco era forte e estável. Inclinou-se sobre ela e verificou a respiração sobre o queixo.

Abanou a cabeça e deixou escapar um suspiro de alívio.

Analisou o seu estado com os olhos de um xerife. Não parecia ter nenhum osso partido. Mas tinha, no entanto, uma contusão na testa que estava a inchar.

Ao fixar o rosto oval, os olhos começaram a ser os de um homem qualquer. Não conseguia evitá-lo. Ele era um canalha com necessidades e ela parecia um anjo. Tinha uns lábios como o arco de cupido, uma pele sedosa e um pescoço longo, mas também tinha um queixo proeminente que anunciava um temperamento obstinado.

Desceu mais o olhar. Vestia uma t-shirt cinzenta e uns jeans gastos e tinha umas curvas impressionantes.

Tomou fôlego e disse para si próprio que era um depravado e um idiota. Ao fim e ao cabo, era a típica caminhante com a típica roupa de caminhante. Tirando as botas. Eram das melhores. Não restavam dúvidas que esta mulher tinha dinheiro.

O rio rugia entre as rochas e captou a sua atenção. Dan cerrou os dentes. Aquela mulher poderia ter caído na margem do rio.

Inclinou-se sobre ela.

– Senhora, acorde.

Não obteve outra resposta senão um delicado aroma.

– Senhora, consegue ouvir-me?

Ela deixou escapar um suave gemido, moveu-se ligeiramente e fez um esgar de dor. Dan pensou que a dor era um bom sinal, mas que seria ainda melhor reanimá-la.

– Tem que despertar agora mesmo. Abra os olhos e olhe para mim – disse-lhe, com um tom mais apropriado para capturar delinquentes do que para aliviar vítimas.

Pestanejou e abriu os olhos. Uns olhos violeta olharam-no e fizeram com que sentisse o estômago oprimido.

– Consegue ouvir-me?

Ela assentiu com a cabeça.

– Veio sozinha?

O seu rosto de anjo reflectiu o seu aturdimento.

– Não sei – respondeu.

– Sente-se maldisposta?

– Um pouco.

Dan franziu a testa. Sabia um pouco sobe lesões na cabeça e isso parecia uma comoção cerebral.

– Dói-lhe a cabeça?

– Sim.

A resposta chegou num fio de voz, mas ele cerrava os dentes sem dissimular o seu desgosto perante o seu olhar e aturdimento.

Conseguia ver outra mulher, a sua namorada, com o rosto lívido e os lábios entreabertos a olhar para um fugitivo de dois metros e corpo musculoso ao qual ele devia estar a apontar a sua pistola.

Teria Janice tido esta aparência? Teria estado assim tão assustada e desesperada?

Cerrou os dentes até quase quebrá-los. Por amor de Deus! Aquela noite terrível tinha sido há quatro anos. Quantas vezes ia revivê-la? Ele não tinha estado ali para ajudá-la, não podia ter estado ali, assunto arrumado. Ele estava na cama de um hospital com uma bala na perna.

Além disso, o maldito canalha estava entre grades, que era onde devia estar. Naturalmente, um pouco mais maltratado do que da outra vez que o tinham prendido. Algo que tinha custado a Dan que o mandassem para uma cabana nas montanhas para que reflectisse sobre o que tinha feito e, se tudo corresse como o previsto, se arrependesse de tê-lo feito.

Resmungou. Os seus superiores teriam que esperar bastante tempo até que isso acontecesse.

A mulher que tinha à sua frente gemeu e fechou os olhos. Todas as recordações foram relegadas por algo mais premente.

Aquela mulher precisava de um médico, mas onde ia arranjar um? Ela tinha perdido a mochila e ele não tinha telemóvel.

A verdade era que ele não tinha querido nenhum contacto com o mundo exterior e aquela mulher estava a pô-lo num apuro.

Havia poucas alternativas. A povoação estava a um dia a cavalo.

Suspirou, pegou-lhe ao colo, agarrou as rédeas de Rancon e dirigiu-se de volta à sua cabana.

Capítulo Dois

 

 

 

 

 

 

Pelo seu cérebro passavam imagens de declives cheios de flores, penhascos rochosos e de um homem perigosamente atraente com olhos escuros e penetrantes que se misturavam com a dor que sentia sobre a sobrancelha esquerda e o martelar fundo na cabeça.

Ouviu um lamento ao longe. Era um som feminino, mas grave e algo transtornado. Queria correr para ela, abraçá-la, dizer-lhe algumas palavras de consolo. Mas onde estava?

– Tem que acordar.

A voz masculina rompeu a neblina que tinha na cabeça. A dor tornou-se mais aguda ao tentar obedecer. Sentia-se pesada e inchada. Só queria dormir.

– Sei que consegue ouvir-me – insistiu o resmungar masculino. – Abra os olhos ou haverá problemas.

Sentiu uns dedos frios e fortes na base do pescoço. Respirou bruscamente e captou o cheiro a pinho, a cabedal, a suor… a virilidade…

Fez um grande esforço para abrir os olhos. A poucos centímetros havia um homem. Um homem implacavelmente bonito, com um cabelo negro despenteado, uns olhos brilhantes, um queixo firme, um nariz partido que já tinha visto… quando?

Tensa por causa do medo, cravou o olhar naqueles olhos escuros como chocolate derretido, chocolate quente.

– Quem é você? – disse, com uma voz rouca.

O olhar do homem percorreu-lhe descaradamente a cara. Passou dos lábios aos olhos.

– Primeiro, apresente-se você.

Aturdida, franziu a testa, mas não discutiu. Uma suspeita alarmante apoderava-se dela. Abriu a boca, convencida de que o seu nome sairia fluentemente, mas não conseguiu dizer nada.

O pânico retorceu-lhe as entranhas e sentiu uma angústia que não conseguia definir. Começou a tremer. A garganta secou-lhe. Fechou os olhos, quis concentrar-se e acalmar-se. Tudo era absurdo. Tinha a resposta na ponta da língua. Sabia quem era e de onde tinha chegado.

Passou o tempo, mas continuava sem poder dizer nada.

Abriu os olhos.

– Não sei quem sou.

Dos lábios de Dan saiu um impropério.

Tinha que haver uma explicação para tudo, disse-se ela. Apenas tinha que pensar, esperar um pouco e concentrar-se.

– Somos amantes? Estamos casados? – perguntou com um tom de tranquilidade que não sentia.

– Não – resmungou ele.

– Somos amigos? Conhecidos?

– Não.

Ela olhou nervosamente em redor. Estava num quarto pequeno que só tinha uma cama, um armário e uma cadeira de baloiço. O tecto tinha vigas de madeira e viu umas montanhas imponentes através das grandes janelas que havia na parede.

Era uma cabana de madeira.

Não lhe lembrava nada.

– Estamos em sua casa?

Dan confirmou com a cabeça.

Ela moveu-se com inquietação sob os lençóis.

– Esta é a sua cama?

– Sim – um brilho de perigo quase imperceptível cruzou-lhe os olhos. – Só tenho esta. – Pensei que estaria mais cómoda aqui do que no sofá.

– Agradeço-lhe…

Dan levantou-se, fazendo um gesto com a cabeça.

– Certamente precisa de descansar um pouco.

Ela, impulsivamente, estendeu o braço e agarrou-lhe o pulso.

– Espere. Por favor.

Ele olhou-a com uma sobrancelha arqueada.

– O que é?

– Perdão – corou e soltou-lhe o pulso. – Só quero saber o que se passou…

– Sabê-lo-á em breve. Agora, descanse – voltou-se e foi até à porta.

– Pode dizer-me o seu nome, pelo menos?

Ele deteve-se, mas não se voltou.

– Dan.

– Dan… quê?

– Dan chega.

Saiu do quarto e deixou-a com um milhão de perguntas e sem memória.

 

Quando começava a escurecer, Dan guardou os troncos que tinha cortado nessa manhã e deixou-os junto à lareira.

O trabalho físico era a sua salvação. Se começava a pensar no passado ou a meditar sobre o futuro, agarrava o machado e espairecia assim. Por vezes também lhe fazia bem limpar o esterco do estábulo de Rancon.

No entanto, esta noite não era assim.